Em 1940, o futebol feminino se tornou uma verdadeira febre que atraía torcedores e estava prestes a ganhar todo o país. Infelizmente, esse cenário próspero, que pode até soar fictício, recebeu um duro golpe com a decisão do Governo Vargas de proibir a participação de mulheres em esportes “incompatíveis com as condições de sua natureza”.
Escrita pelo museólogo e pesquisador Auriel de Almeida e publicada pela Hanoi Editora, a obra Evas do gramado resgata a trajetória do Primavera Atlético Clube, sediado no Rio de Janeiro, de sua fundadora Carlota Alves de Rezende e das craques Nicéa, Sally e Aída. Hoje praticamente desconhecidas, elas foram as responsáveis por comandar o time que se tornou o maior representante feminino da capital carioca, na época também capital nacional, antes do banimento.
Os impactos dessa proibição, que durou quase 40 anos e só foi derrubada em 1979, reverberam no esporte até hoje. Apesar da excelência das mulheres no futebol – a artilheira Marta, por exemplo, é recordista em títulos de melhor jogadora do mundo, e isso inclui os homens –, os investimentos da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) na seleção feminina seguem escassos, com queda de 40% em 2022, enquanto a masculina recebeu 45% a mais de apoio.
Os relatos de Evas do Gramado, no entanto, comprovam que o futebol feminino faz parte da tradição esportiva do país. Por meio de uma pesquisa documental minuciosa, o livro reconta a trajetória do clube de forma envolvente, desde seu surgimento e inúmeras partidas de sucesso, até a perseguição policial baseada em acusações infundadas e o encerramento forçado da equipe.
Um pesadelo sem fim. Assim podia ser definido os dias que se seguiram à prisão de Carlota Alves de Rezende, com a ridícula acusação de lenocínio. O Primavera Atlético Clube havia sido fechado pela polícia, e os demais clubes, com medo, evitavam a marcação de partidas. Era evidente que esta era só uma forma de constranger a prática de futebol feminino.
(Evas do gramado, p. 85)
O livro também aborda outras equipes femininas de sucesso da época como o Sport Club Brasileiro, Cassino Realengo, Opposição e Independente. Empregando diálogos e descrições que transportam o leitor para dentro da história, o autor evidencia a importância de conhecer a fundo os triunfos e percalços dessas mulheres.
Ao ressaltar o legado das jogadoras no futebol e relembrar o potencial sufocado pelo Estado e pela falta de investimento das instituições reguladoras, Auriel de Almeida oferece aos leitores uma oportunidade única de se familiarizar com um fragmento menosprezado, porém crucial, da memória brasileira. Evas do gramado, além de documentar um afronte às liberdades, se destaca como uma ode às pioneiras que abriram caminho para as gerações futuras de esportistas.
Ficha técnica
Livro: Evas do gramado – A história do Primavera Atlético Clube, o time de futebol feminino proibido no Governo Vargas
Autoria: Auriel de Almeida
Editora: Hanoi Editora
ISBN: 978-8554823009
Páginas: 108
Preço: R$ 48,00
Onde encontrar: Amazon
Sobre o autor
Nascido em Niterói, Auriel de Almeida é museólogo e designer, já tendo trabalhado no jornal Lance! Apaixonado pelos campeonatos antigos, seus clubes, escudos e uniformes, dedica-se à pesquisa desde os tempos de universitário, e tomou-se colaborador da RSSSF Brasil em 2008. Em 2011, deu início à carreira de escritor, tendo outros três livros publicados: “Passos do Campeão”, “Jogos Memoráveis do Botafogo” e “Camisas do Futebol Carioca”. Desde 2017, é coordenador editorial na Hanoi Editora.